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ProduçãoCemitérios Sagrados
Salete
Uma lendária cidade há muito o que contar. Quantas almas malignas cruzaram essas distintas paisagens, deixando para trás histórias sombrias? Lembraremos aqui um desses espíritos capazes de cavar covas com mais de mil palmos.
Uma jovem estudante se perdeu dos amigos na noite de sua formatura. O fato ocorreu no fim dos anos oitenta, contam homens e mulheres de Jaboatão velho.
Os rapazes estavam embriagados, sob a carraspana de um drinque oferecido durante a festa. As mulheres, uma a uma, dispersaram-se acompanhadas dos pais e namorados. Mas no balcão da recepção, uma delas se servia de doses inesgotáveis.
Salete estava feliz ao lado dos amigos, vestida de Polainas e uma Saia colegial, despertava seu entusiasmo com tequila e sal marinho. Seu sorriso ingênuo não imaginava que a maldade forjava, com paciência e discrição, um crime impiedoso.
O espírito estava, naquele instante, sussurrando a noite que nunca se acabaria. Faltavam poucas horas para o sol nascer, Salete transbordava uma força estranha em seu peito, praticamente rasgando fora a blusa para se livrar da agonia.
No ponto central de Jaboatão Velho, ruelas sem fim se amarravam, o trânsito quase fantasmagórico metia medo. Além dos desafortunados, apenas cães rasteiros catando lixo. Uma frágil jovem ,sitiada pelas ruas da cidade, acabaria como presa nas mãos de oportunos caçadores.
Devido o seu estado tortuoso, a tragédia se anunciava antes da noite acabar. Enquanto os primeiros raios do sol ainda não despontavam, labirintos se formavam num único lugar. Parecia pesadelo, indo e voltando, o relógio só batia a mesma hora .
Salete estava pronta para se entregar à morte. Encantada pelo mal, seguia um ritmo sem volta, esbugalhando os olhos feitos de fogo. Sua pele escurecida, descolava- se do corpo. A boca fria cerrava os dentes tal qual um cão. Por um momento, a madrugada pareceu mais rasa, a voz que lhe acompanhava selou ,por fim, a alma mais pura que poderia levar .
O mundo parou de girar para que, pacientemente, Salete tirasse as polainas, subisse na proteção da ponte, desse seu último suspiro e se jogasse. Seu corpo foi arrastado pelas águas, chocando-se entre as pedras, afundando e emergindo, partindo-se como palito entre os dedos, até desaparecer e só aparecer no dia seguinte aos pedaços.
Moradores da cidade acordaram em choque, todos se resignaram durante sete dias e sete noites, armaram campanas na via crucis por onde a jovem passou, para que o espírito de Salete Sousa Cipriano pudesse descansar em paz.